Pouco trágico, pouco indulgente, pouco industrioso. Apoucado, pois, exceto de mornidão.
Um miserando.
"Sempre me surrupiaram o cimo!", barrocava. Daí a sua atividade diária: ver quantas vezes chegara atrasado, quantos à sua frente faziam das ideias obras. Resultado: retardatava, até no imaginado.
Creditava a sua desdita aos vizinhos. A começar pelos do berçário, que certamente urraram no tom que desviara a atenção para onde quer que fosse, menos para ele. Sabia, por não dar conta de esquecer, de um choro seu que não suplicava, nem condoía. Incomodava, se tanto, apenas por passar despercebido. Mas a moléstia era pouca, quase nenhuma, quase a ninguém, exceto a si mesmo.
Odiava. Os escritores, especialmente. Os contemporâneos, particularmente. Os de sua geração, mais ainda. Mas mesmo o ódio, que nos livros fabrica sofisticados personagens e intrincadas tramas, nele se manifestava torpe. Crendo-se ardiloso, cavilosava conspirações tão toscas que só reverberavam em sua limitada consciência. Imaginava-se então descobrindo o domicílio daqueles usurpadores de ideias para fazê-los saber que ele as pensara muito antes, sem admitir dar-se conta disso só depois de tê-las visto impressas, crédito de outros.
Parvas até o tutano, as suas maquinações. Ansiavam grandiloquência, mas faltavam-lhes vulcões. Delas só o estrépito de flatos, se tanto. Sua mais recente manobra: gerar remorsos e culpa nos que ainda tinham-lhe restinga de afeto, matutando sobre o empreendimento e antegozando os resultados.
Só uma coisa lhe amargava: e se fosse verdade? E se parte dessa nódoa fosse sua, fosse inveja desgovernada? E se lhe ocorresse de, por isso, viver mais do que todos? E se todos se fossem, antes de sentirem o talho de sua navalha propositalmente sem fio? O que seria de si?
O amargor virou paúra. E essa, mais do que a inveja, sabidamente prolonga a tibieza da vida, por guardá-la de riscos.
Turvou-se, franziu-se, ensimesmou-se, mais ainda. O calor gerado, porém, foi pouco. Ninguém percebeu. Ninguém.
Cruel... :-)
a pequenez do homem…